Por que eu vou marchar pela humanização do parto em 05/08/2012?

Marcha pela Humanização do Parto, Avenida Paulista, São Paulo
Eu estarei na marcha pela humanização do parto porque sou uma mulher que, pelas estatísticas do IBGE, está no topo da pirâmide socioeconômica do país e, mesmo assim, ao engravidar não sabia NADA sobre parto. NA-DI-CA. Acho, de coração, que é o mínimo que posso fazer para tentar evitar que as futuras gestantes do Brasil sofram da mesma ignorância que eu.


Ao me descobrir grávida, assim como a grande maioria das mulheres, continuei frequentando o meu GO de sempre. Confesso que – devido a um longo processo de NEGAÇÃO – fiz mais de 2/3 do meu pré-natal com ele. “Afinal, quem é bom ginecologista também é bom obstetra, né?”

Felizmente, eu mudei de médico a tempo, mas se eu tivesse as informações que tenho hoje, poderia ter começado logo com o médico certo. E teria economizado desilusão, estresse, desgaste psicológico, indignação, raiva e talvez algumas rugas.

Vou à marcha por questões práticas: o caminho que percorri foi mais longo do que precisava ter sido. Isso se deu simplesmente porque, antes de engravidar, eu nunca ouvira falar em parto humanizado, doula, obstetriz, episiotomia, períneo, parto natural, nitrato de prata, vitamina K, VBAC e tantas outras coisas… “E você?”

Apesar de longo e incômodo – afinal a maternidade é mesmo o encontro com a própria sombra, e a minha não é bonitinha – , meu caminho em direção ao parto natural humanizado foi o seguinte:

No meio da gravidez, conversando com uma amiga sobre uma amiga dela que tinha acabado de ter neném, ouvi, pela primeira vez a palavra doula. Perguntei o que era uma doula, o que fazia. Chegando em casa, fui logo ao Google e descobri que era uma profissão. Uma profissão das mais nobres e objeto de muitos estudos científicos sobre obstetrícia com resultados muito positivos no mundo inteiro. Descobri que o papel da doula é cuidar da gestante durante o parto. Frise-se da GESTANTE. “Como assim?” “Mas é o bebê que precisa de cuidados?” “E por que ninguém nunca me falou de doula, afinal eu era gestante?”

Na consulta seguinte, perguntei a meu médico sua opinião sobre as doulas. Ele revirou os olhos no modo ai-que-saco, controlou-se e educadamente me disse que se eu fizesse questão “é claro” eu poderia ter uma, mas que ele não achava necessário eu “gastar dinheiro à toa”. “Como assim?” “E os estudos científicos comprovando que a mulher acompanhada por uma doula tem 20% mais chance de ter um parto normal?” “Que a mulher acompanhada por doula tem maior índice de satisfação no parto?”, “Que a mulher acompanhada por uma doula tem menos chances de sofrer intervenções desnecessárias?”, “Aliás, o que são intervenções desnecessárias!?”

Apesar da “dica” do meu médico em prol das minhas finanças, depois de tudo que eu havia lido, eu estava decidia. Eu iria ter uma doula anyway. E assim comecei a procurar. Pedi para aquela amiga da minha amiga o telefone da doula dela. Liguei.

Conversamos longamente. Ela me deu respostas que até então – às 30 semanas de gravidez – meu médico se esquivara de responder, sempre dizendo que estava muito cedo para falar do parto. Eram perguntas simples sobre a fisiologia do parto, duração, estágios. “Oi!? Cedo?” “Como assim?” “Qual o mistério?” “Ninguém pariu antes de mim?” Mas não vou digress e começar a descer a lenha no meu ex-GO porque a fase da IRA já passou.
Tendo ficado muito feliz e realizada com as respostas da doula, resolvi contratá-la. Ela então me perguntou quem era o meu médico. Eu respondi. Ela me disse meio que murmurando que com ele ela não trabalhava, mas que poderia indicar outras doulas que me acompanhassem. A essa altura eu estava em modo automático por conta da pulga. Mesmo assim tomei nota de alguns nomes. Nos despedimos. Desliguei o telefone. Contei 1, 2, 3. Liguei de volta: “Mas por que mesmo você não atende com o meu médico?” Ela me respondeu que já o vira fazer cesáreas desnecessárias e intervenções de rotina, como episiotomia. “Cesárea desnecessária, tem médico que faz?” “Episiotomia? O que é isso?”.
Voltei ao meu médico tentando uma NEGOCIAÇÃO. “Doutor, você faz episiotomia?” “Claro, faço em todos os meus partos por que é procedimento.” “Mas, precisa mesmo? Pois há vários estudos que não indicam o uso da técnica e…” “Faço em todos.” E ponto. “Doutor, até quando você me espera entrar em trabalho de parto?” “No máximo, 40 semanas.” ” Depois disso é preciso operar.” ” Como assim? Uma gravidez não dura até 42 semanas?” “Depois da 40ª não tem necessidade de esperar.” “Oi?! Como não se ainda está dentro do prazo.”

Depois dessa consulta, voltei para a casa e tive um ataque histérico com o Edu. “Como os estudos mostram isso? E ele diz isso? E ele faz episio de rotina? E o índice dele de parto normal é de só 50% – a OMS recomenda 85%?” O Edu me acalmou e disse mais uma vez (não foi a primeira): “Esse cara vai te operar. Mude logo de médico.”

Não é fácil mudar de médico.

Para reunir mais razões, – Dã!- comecei a chegar mais cedo às consultas para ver o perfil das outras pacientes. Para o meu choque TODAS as puérperas tinham parido por cesárea. Eu ainda prolongando desnecessariamente a fase da NEGOCIAÇÃO, perguntei-lhe se eu poderia falar com uma das pacientes dele que pariu por parto normal para saber da experiência dela. No meio da ligação, descobri que o tal parto tinha sido 18 anos atrás!
Corro de novo para o colo do Edu. “Aconteceu isso, isso, isso e isso. “O Edu me acalmou e disse pela centésima vez: “Esse cara vai te operar. Mude logo de médico.” Enfim, entrei na fase da ACEITAÇÃO.

Foi quando liguei para a doula novamente. “Com que médicos você atende?” “Fulano, Beltrano e Sicrano.”

O Edu e eu fomos ao Google. Eu estava com 32 semanas. Fizemos nossa escolha. Marcamos uma consulta.

Na primeira consulta, meu novo GO me explicou sobre as fases do parto e me pediu que fizesse um plano de parto. “O que é um plano de parto?”

Nas seguintes, me deu opções sobre o que eu gostaria de fazer durante o parto – andar, comer, massagem, música etc. – o que eu queria que fosse feito com o meu bebê, me informou que eu poderia contratar um pediatra neonatal que respeitasse as minhas escolhas em relação ao bebê, pois dificilmente o plantonista foge ao protocolo. Aprendi sobre a dor que causa o colírio de nitrato de prata, que vitamina k não precisa ser injetável, que o cordão não deve ser cortado imediatamente, mas apenas quando para de bater para evitar anemia, aprendi que não é necessário aspirar o bebê se ele já estiver chorando ou respirando normalmente, aprendi que o parto normal na posição deitada é o mais difícil, que tomar anestesia muito cedo pode estancar o trabalho de parto, que havia um aparelhinho para exercitar o períneo e evitar a episiotomia, descobri que tem fisioterapeuta especializada em períneo, que circular de cordão, neném grande, neném pequeno, bacia estreita e tantos outros não são motivos para agendar uma cesárea, que há listas de discussão para gestantes que querem saber sobre parto humanizado e se empoderar, que a protagonista do parto é a mulher e não o médico, e muitas outras coisas que nem caberiam aqui…

Um novo universo se abriu a tempo!

Tive meu primeiro filho com 39.5 semanas de gravidez em um lindo parto normal humanizado. Tive meu segundo filho na 41ª semana em um lindo parto na água.

A sensação de perceber que meu corpo funcionava per-fei-ta-men-te foi a mais fantástica e realizadora que já senti. E isso não é pouco. Pois, pare um momento e perceba como nós mulheres somos bombardeadas diariamente com mensagens de que não somos magras ou bonitas o suficiente, jovens o bastante, que o cabelo e o peito são assim ou assado, que precisamos de cirurgia plástica, que devemos pintar o cabelo e que não somos capazes de parir naturalmente…

A sensação de realização, empoderamento, plenitude, confiança em mim mesma e orgulho do meu corpo me fez querer contribuir um pouquinho para o movimento do parto humanizado e marchar – e panfletar.

Voltando…

Quando penso nas jovens mulheres com quem eu trabalho diariamente, minhas alunas queridas, futuras mamães, gostaria que elas tivessem o mesmo tratamento respeitoso e condições de escolher que eu tive nos meus partos. Desejo a elas – se filhos estiverem em seus planos – um caminho menos tortuoso rumo ao parto humanizado e que as informações embasadas cientificamente estejam a seu alcance ANTES de engravidar em vez de terem que ser escafandradas durante um momento tão único na vida de uma mulher: a gravidez.

Eu vou estar na marcha porque meu sonho é que todas as mulheres tenham condições de verdadeiramente escolher o parto que querem de acordo com informações verdadeiras.
E se esse lhe parece um sonho bobo, não tem problema nenhum, estou no auge da fase da ACEITAÇÃO.

Nos vemos na marcha no dia 05 de Agosto?

Um beijo e obrigada por ter lido até aqui,

Luciana Carvalho

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